segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

FÁTIMA, A FIANDEIRA


Numa cidade do mais longínquo Ocidente, vivia uma jovem chamada Fátima, filha de um próspero fiandeiro.
Um dia o pai lhe disse:
- Vem, filha, faremos uma viagem, pois tenho negócios a resolver nas ilhas do mar Mediterrâneo. Talvez encontres por lá algum jovem atraente, de boa posição, com quem poderias casar.
Puseram-s...e a caminho e viajaram de ilha em ilha; o pai cuidando de seus negócios, enquanto Fátima sonhava com o marido que logo poderia ter. Mas um dia, quando estavam a caminho de Creta, levantou-se uma tempestade e o barco naufragou. Fátima semiconsciente, foi arrastada a uma praia perto de Alexandria.
Seu pai tinha morrido e ela ficou totalmente desamparada. Podia recordar-se apenas vagamente de sua vida até aquele momento, pois a experiência do naufrágio, e o fato de ter ficado exposta às inclemências do mar, tinham-na deixado completamente exausta.
Quando vagava na areia, uma família de tecelões a encontrou. Embora fossem pobres, levaram-na para sua casa humilde e ensinaram-lhe seu ofício. Desse modo, Fátima iniciou uma nova vida, e dentro de um ou dois anos voltou a ser feliz, reconciliada com sua sorte. Porém, um dia, quando estava na praia, um bando de mercadores de escravos desembarcou e a levou, junto com outros cativos.
Apesar de Fátima lamentar-se amargamente por seu destino, eles não demonstraram nenhuma compaixão: levaram-na para Istambul e a venderam como escrava. Seu mundo tinha desmoronado pela segunda vez.
No mercado havia poucos compradores. Um deles era um homem que procurava escravos para trabalhar em sua serraria, onde fabricava mastros para embarcações. Quando viu o abatimento da infeliz Fátima, decidiu comprá-la pensando que poderia proporcionar-lhe uma vida um pouco melhor do que teria nas mãos de outro comprador.
Levou Fátima para casa, com a intenção de fazer dela uma criada para sua esposa. Ao chegar, soube que tinha perdido todo o seu dinheiro quando um carregamento fora capturado por piratas. Não podia enfrentar as despesas que lhe davam os empregados, e assim ele, Fátima e sua mulher arcaram sozinhos com a pesada tarefa de fabricar mastros.
Fátima, grata ao seu patrão por tê-la resgatado, trabalhou tão arduamente e tão bem que ele lhe deu a liberdade e ela passou a ser sua auxiliar de confiança. Assim, chegou a ser relativamente feliz em sua terceira profissão.
Um dia, ele lhe disse:
_ Fátima, quero que vás a Java, como minha agente, com um carregamento de mastros, procura vendê-los com lucro.
Ela se pôs a caminho, mas, quando o barco estava diante da costa chinesa, um tufão o fez naufragar. Mais uma vez Fátima se viu jogada na praia de um país desconhecido. De novo chorou amargamente, porque sentia que em sua vida nada acontecia como esperava. Sempre que tudo parecia andar bem, acontecia algo que destruía suas esperanças.
_ Porque será – perguntou pela terceira vez – que sempre que tento fazer alguma coisa ela não dá certo? Por que devo passar por tantas desgraças?
Como não teve respostas, levantou-se da areia e afastou-se da praia.
Ninguém na China tinha ouvido falar de Fátima e de seus problemas. Mas existia uma lenda de que chegaria certa mulher estrangeira, capaz de fazer uma tenda para o imperador. Como naquela época não existia ninguém na China que soubesse fazer tendas, todo mundo aguardava com ansiedade o cumprimento da profecia.
Para ter certeza de que a estrangeira, ao chegar, não passaria sem ser notada, uma vez por ano os sucessivos imperadores da China costumavam mandar seus mensageiros a todas as cidades e aldeias do país, pedindo que toda mulher estrangeira fosse levada à corte.
Exatamente, numa dessas ocasiões, esgotada, Fátima chegou a uma cidade costeira da China. Os habitantes do lugar falaram com ela através de um intérprete, e lhe explicaram que devia ir à presença do imperador.
_ Senhora – disse o imperador quando Fátima foi levada até ele – sabe fabricar uma tenda?
_ Acho que sim – respondeu a moça.
Pediu cordas, mas não tinham. Lembrando-se dos seus tempos de fiandeira, Fátima então colheu linho e fabricou-as. Depois pediu um tecido resistente, mas os chineses não tinham do tipo que ela precisava. Então, utilizando suas experiências com os tecelões de Alexandria, fabricou um tecido forte, próprio para tendas. Percebeu que precisava de estacas para a tenda, mas não existiam no país. Lembrando-se do que lhe ensinara o fabricante de mastros em Istambul, Fátima fabricou umas estacas firmes. Quando tudo estava pronto, deu tratos à bola procurando lembrar de todas as tendas que tinha visto em suas viagens. E uma tenda foi construída.
Quando a maravilha foi mostrada ao imperador da China, ele se prontificou a satisfazer qualquer desejo que Fátima expressasse. Ela quis morar na China, se casou com um belo príncipe e, rodeada por seus filhos, viveu muito feliz até o fim de seus dias.
Através dessas aventuras, Fátima compreendeu que o que em cada ocasião lhe tinha parecido ser uma experiência desagradável, acabou sendo parte essencial para a sua felicidade.
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RETOMADA

Fiquei com a missão de criar um blog para minha mãe e aí me lembrei de uma grande pendência: E O MEU? Quanto tempo se passou!...
Estive por um bom tempo indecisa com o que fazer com este blog. Eu tava achando que eu estava me expondo demais e que era melhor alterar o conteúdo ou mudar o objetivo... mas acabei de tomar a decisão de continuá-lo desta forma mesmo! Não estou no mundo a passeio nem vim para me esconder, então qual o problrma de me expor? Qual o objetivo teria o blog se não fosse para revelar o que estou vivendo? Algumas coisas que quero escrever não são apropriadas para postar em Facebook. Por isso mesmo, antes de atualizar minha Jornada vou retomar com uma história da tradição sufi que resume o que sinto atualmente.
FELIZ 2011

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

A escolha do Rei Arthur

O jovem Rei Arthur foi surpreendido pelo monarca do reino vizinho enquanto entrava furtivamente em um bosque. O Rei poderia tê-lo matado  no ato, pois
tal era o castigo para quem violasse as leis da  propriedade, contudo se comoveu ante a juventude e a  simpatia de  Arthur e lhe ofereceu a liberdade, desde que no prazo de um ano trouxesse a resposta a uma pergunta difícil. A pergunta era: O que  realmente as mulheres querem?

Semelhante pergunta deixaria perplexo até ao homem mais sábio, e ao  jovem
Arthur lhe pareceu impossível respondê-la. Contudo aquilo era melhor do que a morte, de modo que regressou a seu reino e comecou a interrogar as pessoas. A princesa, a rainha, as prostitutas, os monges, os sábios, o bobo da corte, em suma, a todos e ninguém soube dar uma resposta convincente. Porém todos o aconselharam a consultar a velha bruxa, porque  somente ela saberia a resposta. O preço seria alto, já que a velha  bruxa era  famosa em todo o reino pelo exorbitante preço cobrado pelos seus serviços.

Chegou o úlltimo dia do ano acordado e Arthur não teve mais remédio se não
recorrer a feiticeira. Ela aceitou dar-lhe uma  resposta, com uma condição: ela queria casar-se com Gawain, o cavaleiro mais nobre da Távola Redonda e o mais íntimo amigo do Rei Arthur! O jovem Arthur olhou horrorizado: ela era feíssima, tinha um só dente, desprendia um fedor que causava náuseas até a um cachorro, fazia ruídos obscenos,...nunca havia topado com uma criatura tão repugnante. Se acovardou diante da perspectiva de pedir a um amigo de toda a sua vida para assumir essa carga terrível. Não obstante, ao inteirar-se do pacto proposto, Gawain afirmou que não era um sacrifício excessivo em troca da vida de seu melhor amigo e a preservação da Távola Redonda.

Anunciadas as bodas, a velha bruxa, com sua sabedoria infernal, disse: O que realmente as mulheres querem: Serem soberanas de suas proprias vidas! Todos souberam no mesmo instante que a feiticeira havia dito uma grande verdade e que o jovem Rei Arthur estaria salvo. Assim que ouviu a resposta, o monarca vizinho  lhe devolveu a liberdade. Porém, que bodas tristes foram aquelas, ...  toda a corte assistiu e ninguém se sentiu mais desgarrado entre o alívio e a angústia, que o próprio Arthur.

Gawain se mostrou cortês, gentil e respeitoso. A velha bruxa usou de seus piores hábitos, comeu sem usar talheres, emitiu ruídos e um mau cheiro espantoso.

Chegou a noite de núpcias. Quando Gawain, já estava preparado para ir para a
cama e aguardava sua esposa, ela apareceu como a mais linda e charmosa mulher que um homem poderia imaginar! ... Gawain ficou estupefato e lhe perguntou o que havia acontecido. A jovem lhe respondeu com um sorriso doce, que como havia sido cortês com ela, a metade  do tempo se apresentaria com aspecto horrível e a outra  metade com aspecto de uma linda donzela. Então ela lhe perguntou. Qual ele preferiria para o dia e qual para a noite? Que pergunta cruel, ... Gawain se apressou em fazer cálculos...Poderia ter uma jovem adorável durante o dia para exibir a seus amigos e à noite na privacidade de seu quarto uma bruxa espantosa ou quem sabe ter de dia uma bruxa e uma jovem linda nos momentos íntimos de sua vida conjugal.

O nobre Gawain respondeu que a deixaria escolher por si mesma. Ao ouvir a resposta ela anunciou que seria uma linda jovem de dia e de noite, porque ele a havia respeitado e permitido ser dona de sua vida.

EROS E PSIQUÊ

A JORNADA DE PSIQUÊ, quer dizer, a minha própria jornada foi evocada após a aparição de um anjo em minha vida após um momento de luto. Comecei a me sentir chamada a retomar a vida quando encontrei alguém que me mostrou que eu deveria começar a me reaproximar de mim mesma, voltar a pensar no que eu espero de um relacionamento, de um companheiro, mas antes disso e mais importante ainda, como reencontrar meus valores... minha alma!
A análise dos Mitos e dos Contos sempre favorecem o entendimento dos padrões humanos e minha antiga identificação com o mito de Eros e Psiquê fez eu retomar essa história como pano de fundo para a minha jornada. A união de Psiquê e Eros me remetem ao meu casamento desfeito quando a realidade foi encarada de frente, revelando que um relacionamento não se mantém fugindo da verdade e sem respeitar a essência e a identidade do companheiro. (Aqui abro um parênteses por lembrar de uma história que complementa essa idéia: A Escolha do Rei Arthur). Assim, a minha atual Jornada Heróica tem como objetivo principal a busca do Feminino Sagrado As tarefas impostas a Psiquê constituem o momento atual de minha vida.





EROS E PSIQUÊ

“Era uma vez um rei que tinha três filhas. Duas eram lindas, mais a mais nova era muito, muito mais bonita. Dizia-se até que Afrodite - a deusa da beleza - não era tão bonita quanto Psiquê. Os templos de Afrodite andavam vazios porque as pessoas, principalmente os homens, passaram a cultuar aquela princesa maravilhosa.
      Afrodite ficou com ciúme e pediu para seu filho, Eros, preparar uma vingança. Ela queria que Psiquê se apaixonasse por um monstro horrível. Só que Eros também acabou sendo atingido pelos encantos da menina. Ele ficou tão maravilhado ao ver Psiquê que não conseguiu cumprir a ordem da mãe.
      O estranho é que todos aqueles homens que ficavam enfeitiçados com sua beleza não se aproximavam e nem tentavam namorá-la. As duas irmãs, que perto da caçula não tinham a menor graça, logo arranjaram pretendentes e cada uma se casou com um rei. A família ficou preocupada com a solidão de Psiquê. Então, um dia, o pai resolveu perguntar ao oráculo de Apolo o que deveria fazer para a menina arranjar um marido. O que ele não sabia é que Eros já havia pedido a Apolo para ajudá-lo a cumprir aos planos de sua mãe. A resposta que o rei levou para casa o deixou muito mais preocupado do que já estava: o deus falou que Psiquê deveria ser vestida de luto e abandonada no alto de uma montanha, onde um monstro iria buscá-la para fazer dela sua esposa.
      Embora muito triste, a família cumpriu essas determinações e Psiquê foi deixada na montanha. Sozinha e desesperada, ela começou a chorar. Mas, de repente, surgiu uma brisa suave que a levou flutuando até um vale cheio de flores, onde havia um palácio maravilhoso, com pilares de ouro, paredes de prata e chão de pedras preciosas.
      Ao passar pela porta ouviu vozes que diziam assim: "Entre, tome um banho e descanse. Daqui a pouco será servido o jantar. Essa casa é sua e nós seremos seus servos. Faremos tudo o que a senhora desejar". Ela ficou surpresa. Esperava algo terrível, um destino pior que a morte e agora era dona de um palácio encantado. Só uma coisa a incomodava: ela estava completamente sozinha. Aquelas vozes eram só vozes, vinham do ar.
      A solidão terminou à noite, na escuridão, quando o marido chegou. E a presença dele era tão deliciosa que Psiquê, embora não o visse, tinha certeza de que não se tratava de nenhum monstro horroroso.
      A partir de então sua vida ficou assim: luxo, solidão e vozes que faziam suas vontades durante o dia e, à noite, amor. Acontece que a proibição de ver o rosto do marido a intrigava. E a inquietação aumentou mais ainda quando o misterioso companheiro avisou que ela não deveria encontrar sua família nunca mais. Caso contrário, coisas terríveis iam começar a acontecer.
      Ela não se conformou com isso e, na noite seguinte, implorou a permissão para ver pelo menos as irmãs. Contrariado, mas com pena da esposa, ele acabou concordando. Assim, durante o dia, quando ele estava longe, as irmãs foram trazidas da montanha pela brisa e comeram um banquete no palácio.
      Só que o marido estava certo, a alegria que as duas sentiram pelo reencontro logo se transformou em inveja e elas voltaram para casa pensando em um jeito de acabar com a sorte da irmã. Nessa mesma noite, no palácio, aconteceu uma discussão. O marido pediu para Psiquê não receber mais a visita das irmãs e ela, que não tinha percebido seus olhares maldosos, se rebelou, já estava proibida de ver o rosto dele e agora ele queria impedi-la de ver até mesmo as irmãs? Novamente, ele acabou cedendo e no dia seguinte as pérfidas foram convidadas para ir ao palácio de novo. Mas dessa vez elas apareceram com um plano já arquitetado.
      Elas aconselharam Psiquê a assassinar o marido. À noite ela teria que esconder uma faca e uma lamparina de óleo ao lado da cama para matá-lo durante o sono.
      Psiquê caiu na armadilha. Mas, quando acendeu a lamparina, viu que estava ao lado do próprio Eros, o deus do amor, a figura masculina mais bonita que havia existido. Ela estremeceu, a faca escorregou da sua mão, a lamparina entornou e uma gota de óleo fervente caiu no ombro dele, que despertou, sentiu-se traído, virou as costas, e foi embora. Disse: "Não há amor onde não há confiança".
      Psiquê ficou desesperada e resolveu empregar todas as suas forças para recuperar o amor de Eros, que, a essa altura, estava na casa da mãe se recuperando do ferimento no ombro. Ela passava o tempo todo pedindo aos deuses para acalmar a fúria de Afrodite, sem obter resultado. Resolveu então ir se oferecer à sogra como serva, dizendo que faria qualquer coisa por Eros.
      Ao ouvir isso, Afrodite gargalhou e respondeu que, para recuperar o amor dele, ela teria que passar por uma prova. Em seguida, pegou uma grande quantidade de trigo, milho, papoula e muitos outros grãos e misturou. Até o fim do dia, Psiquê teria que separar tudo aquilo. (PRIMEIRA TAREFA)
      Era impossível e ela já estava convencida de seu fracasso quando centenas de formigas resolveram ajudá-la e fizeram todo o trabalho.
      Surpresa e nervosa por ver aquela tarefa cumprida, a deusa fez um pedido ainda mais difícil: queria que Psiquê trouxesse um pouco de lã de ouro de umas ovelhas ferozes (SEGUNDA TAREFA).Percebendo que ia ser trucidada, ela já estava pensando em se afogar no rio quando foi aconselhada por um caniço (uma planta parecida com um bambu) a esperar o sol se pôr e as ovelhas partirem para recolher a lã que ficasse presa nos arbustos. Deu certo, mas no dia seguinte uma nova missão a esperava.
      Agora Psiquê teria que recolher em um jarro de cristal um pouco da água negra que saía de uma nascente que ficava no alto de uns penhascos (TERCEIRA TAREFA). Com o jarro na mão, ela foi caminhando em direção aos rochedos, mas logo se deu conta de que escalar aquilo seria o seu fim. Mais uma vez, conseguiu uma ajuda inesperada: uma águia apareceu, tirou o jarro de suas mãos e logo voltou com ele bem cheio de água negra.
      Acontece que a pior tarefa ainda estava por vir. Afrodite dessa vez pediu a Psiquê que fosse até o inferno e trouxesse para ela uma caixinha com a beleza imortal (QUARTA TAREFA). Desta vez, uma torre lhe deu orientações de como deveria agir, e, assim, ela conseguiu trazer a encomenda.
      Tudo já estava próximo do fim quando veio a tentação de pegar um pouco da beleza imortal para tornar-se mais encantadora para Eros. Ela abriu a caixa e dali saiu um sono profundo, que em poucos segundos a fez tombar adormecida.
      A história acabaria assim se o amor não fosse correspondido. Por sorte Eros também estava apaixonado e desesperado. Ele tinha ido pedir a Zeus, o deus dos deuses, que fizesse sua mãe parar com aquilo para que eles pudessem ficar juntos.
      Zeus então reuniu a assembléia dos deuses e anunciou que Eros e Psiquê iriam se casar no Olimpo e ela se tornaria uma deusa. Afrodite aceitou porque, percebendo que a nora iria viver no céu, ocupada com o marido e os filhos, os homens voltariam a cultuá-la.
      Eros e Psiquê tiveram uma filha chamada Volúpia e viveram Felizes Para Sempre!

domingo, 26 de setembro de 2010

A MULHER ESQUELETO

A Mulher Esqueleto é uma história de caça a respeito do amor

“Ela havia feito alguma coisa que seu pai não aprovava, embora ninguém mais se lembrasse do que havia sido. Seu pai, no entanto, a havia arrastado até os penhascos, atirando-a ao mar. Lá, os peixes devoraram sua carne e arrancaram seus olhos. Enquanto jazia no fundo do mar, seu esqueleto rolou muitas vezes com as correntes.

Um dia um pescador veio pescar. Bem, na verdade, em outros tempos muitos costumavam vir a essa baía pescar. Esse pescador, porém, estava afastado da sua colônia e não sabia que os pescadores da região não trabalhavam ali sob a alegação de que a enseada era mal-assombrada.

O anzol do pescador foi descendo pela água abaixo e se prendeu - logo em que! - nos ossos das costelas da Mulher-esqueleto. O pescador pensou: “Oba, agora peguei um grande de verdade! Agora peguei um mesmo!” Na sua imaginação, ele já via quantas pessoas esse peixe enorme iria alimentar, quanto tempo sua carne duraria, quanto tempo ele se veria livre da obrigação de pescar. E enquanto ele lutava com esse enorme peso na ponta do anzol, o mar se encapelou com uma espuma agitada, e o caiaque empinava e sacudia porque aquela que estava lá embaixo lutava para se soltar. E quanto mais ela lutava, tanto mais ela se enredava na linha. Não importa o que fizesse, ela estava sendo inexoravelmente arrastada para a superfície, puxada pelos ossos das próprias costelas.

O pescador havia se voltado para recolher a rede e, por isso, não viu a cabeça calva
surgir acima das ondas; não viu os pequenos corais que brilhavam nas órbitas do crânio; não viu os crustáceos nos velhos dentes de marfim. Quando ele se voltou com a rede nas mãos, o esqueleto inteiro, no estado em que estava, já havia chegado a superfície e caia suspenso da extremidade do caiaque pelos dentes incisivos.

- Agh! - gritou o homem, e seu coração afundou até os joelhos, seus olhos se esconderam apavorados no fundo da cabeça e suas orelhas arderam num vermelho forte.
- Agh! - berrou ele, soltando-a da proa com o remo e começando a remar loucamente na direção da terra. Sem perceber que ela estava emaranhada na sua linha, ele ficou ainda mais assustado pois ela parecia estar em pé, a persegui-lo o tempo todo até a praia.
Não importava de que jeito ele desviasse o caiaque, ela continuava ali atrás.
Sua respiração formava nuvens de vapor sobre a água, e seus braços se agitavam como se quisessem agarrá-lo para levá-lo para as profundezas.

- Aaagggggghhhh! - uivava ele, quando o caiaque encalhou na praia. De um salto ele estava fora da embarcação e saia correndo agarrado a vara de pescar.
E o cadáver branco da Mulher-esqueleto, ainda preso a linha de pescar, vinha aos solavancos bem atrás dele. Ele correu pelas pedras, e ela o acompanhou.
Ele atravessou a tundra gelada, e ela não se distanciou. Ele passou por cima da carne que havia deixado a secar, rachando-a em pedaços com as passadas dos seus mukluks.

O tempo todo ela continuou atrás dele, na verdade até pegou um pedaço do peixe congelado enquanto era arrastada. E logo começou a comer, porque há muito, muito tempo não se saciava. Finalmente, o homem chegou ao seu iglu, enfiou se direto no túnel e, de quatro, engatinhou de qualquer jeito para dentro.
Ofegante e soluçante, ele ficou ali deitado no escuro, com o coração parecendo um tambor, um tambor enorme. Afinal, estava seguro, ah, tão seguro, é, seguro, graças aos deuses, Raven, é, graças a Raven, é, e também a todo-generosa Sedna, em segurança, afinal.

Imaginem quando ele acendeu sua lamparina de óleo de baleia, ali estava ela - aquilo - jogada num monte no chão de neve, com um calcanhar sobre um ombro, um joelho preso nas costelas, um pé por cima do cotovelo. Mais tarde ele não saberia dizer o que realmente aconteceu. Talvez a luz tivesse suavizado suas feições; talvez fosse o fato de ele ser um homem solitário. Mas sua respiração ganhou um que de delicadeza, bem devagar ele estendeu as mãos encardidas e, falando baixinho como a mãe fala com o filho, começou a soltá-la da linha de pescar.

- Oh, na, na, na. - Ele primeiro soltou os dedos dos pés, depois os tornozelos.
- Oh, na, na, na. - Trabalhou sem parar noite adentro, até cobri-la de peles para aquecê-la, já que os ossos da Mulher-esqueleto eram iguaizinhos aos de um ser humano.

Ele procurou sua pederneira na bainha de couro e usou um pouco do próprio cabelo para acender mais um foguinho. Ficou olhando para ela de vez em quando enquanto passava óleo na preciosa madeira da sua vara de pescar e enrolava novamente sua linha de seda. E ela, no meio das peles, não pronunciava palavra - não tinha coragem - para que o caçador não a levasse lá para fora e a jogasse lá embaixo nas pedras, quebrando totalmente seus ossos.

O homem começou a sentir sono, enfiou-se nas peles de dormir e logo estava sonhando.
Às vezes, quando os seres humanos dormem, acontece de uma lágrima escapar do olho de quem sonha. Nunca sabemos que tipo de sonho provoca isso, mas sabemos que ou é um sonho de tristeza ou de anseio. E foi isso o que aconteceu com o homem.

A Mulher-esqueleto viu o brilho da lágrima a luz do fogo, e de repente ela sentiu uma sede daquelas. Ela se aproximou do homem que dormia, rangendo e retinindo, e pôs a boca junto a lágrima. Aquela única lágrima foi como um rio, que ela bebeu, bebeu e bebeu até saciar sua sede de tantos anos.

Enquanto estava deitada ao seu lado, ela estendeu a mão para dentro do homem que dormia e retirou seu coração, aquele tambor forte.
Sentou-se e começou a batucar dos dois lados do coração: Bom, Bomm!... Bom, Bomm!

Enquanto marcava o ritmo, ela começou a cantar em voz alta.

- Carne, carne, carne! Carne, carne, carne!
- E quanto mais cantava, mais seu corpo se revestia de carne.
Ela cantou para ter cabelo, olhos saudáveis e mãos boas e gordas.
Ela cantou para ter a divisão entre as pernas e seios compridos o suficiente para se enrolarem e dar calor, e todas as coisas de que as mulheres precisam.

Quando estava pronta, ela também cantou para despir o homem que dormia e se enfiou na cama com ele, a pele de um tocando a do outro. Ela devolveu o grande tambor, o coração, ao corpo dele, e foi assim que acordaram, abraçados um ao outro,enredados da noite juntos, agora de outro jeito, de um jeito bom e duradouro.

As pessoas que não conseguem se lembrar de como aconteceu sua primeira desgraça dizem que ela e o pescador foram embora e sempre foram bem alimentados pelas criaturas que ela conheceu na sua vida debaixo d'água.
As pessoas garantem que é verdade e que é só isso o que sabem.” 


A tal história do "Dia 6"

Há algum tempo eu me sentia preparada para viver um relacionamento de forma madura e profunda. Minha procura era por um homem que fosse realmente companheiro, tivesse sua própria individualidade mas que tivesse sintonia comigo em valores ligados a respeito, espiritualidade, responsabilidade, cuidado... Eu queria que esse encontro viesse como uma oportunidade de transformação mútua dentro de um processo evolutivo.
Conheci um homem que entrou na minha vida, na minha casa, na minha alma tão rápida e intensamente que não houve nenhum momento de dúvida ou medo. A proposta de morarmos juntos para nos conhecermos na convivência diária vinha de encontro ao que eu esperava: um homem de atitude! A mudança não parou por aí... esse homem tinha 3 filhos adolescentes sob a guarda dele!!! Então... milhares de novidades. Durante quase 2 anos, a convivência rendeu situações inéditas para mim e entre dificuldades, alegrias, erros e acertos, o resultado foi um aprendizado que só trouxe motivos para agradecimento.
Mas... o famoso mas...
Mas morávamos "como se fôssemos casados"e   vivíamos "como se fôssemos uma família". Para que tudo  isso fosse mais verdadeiro, senti necessidade de realizar um Ritual para Celebramos a União de Amor que já tínhamos. Proposta aceita, marcamos o Ritual para o dia 6 DE FEVEREIRO DE 2010.


6 DE FEVEREIRO = o Ritual foi todo uma criação própria, realizado dentro de um CÍRCULO, misturando elementos que foram sagrados ao nosso relacionamento. Uma amiga querida foi a sacerdotisa da cerimônia contando a história A MULHER ESQUELETO. Nossas famílias participaram de um a OFERENDA (ao som da ORAÇÃO DE SÃO FRANCISCO) em que a simbologia incluía os 4 ELEMENTOS e o PROCESSO DE SEMEAR E COLHER.
Os VOTOS SAGRADOS durante a troca de alianças foi a declamação da singela e belíssima música TE OFEREÇO PAZ!(http://www.youtube.com/watch?v=RCoHD3SNAFo). Vários outros detalhes e lembranças, tudo lindo, tudo emocionante! Momentos de LUZ! No blog do fotógrafo tem um slide para espiar (http://eduardofoto.com/blog/?p=206)
 
A "Lua de Mel" (que não aconteceu) foi o marco da Descida ao Mundo das Trevas. Aos poucos, todos os planos de uma vida em comum foram se desfazendo; o respeito, acabando; o humor, oscilando; os valores, mudando... agressividade, compulsão, intolerância, egoísmo, falta de limite, negatividade foram ganhando força e ocupando espaço. 

6 DE MAIO = apenas 3 meses após a Celebração da União, a separação foi decidida da forma mais insensível e irresponsável. Fui lançada a uma realidade cruel: convivi com um DESCONHECIDO! Quando percebi meu corpo apenas vagava sem alma e sem rumo... perplexo e em colapso. Perdi o apetite e o sono, parei de menstruar por meses seguidos, tive crise de labirintite - sinais do forte estresse. Fui afastada  dotrabalho e aproveitei os dias de licença médica para mudar de casa.  A solidão se refletia em cada uma das paredes, olhava a minha volta em não encontrava mais a família que estávamos construindo... Apenas o choro cortava o insistente silêncio que denunciava a minha dor.


6 DE JUNHO =  novamente reencontrei meu ex-marido, mas naquele dia tive a consciência de estar completando 1 mês de separação ao mesmo tempo em que deveríamos estar comemorando 4 meses de casamento. Minha família e amigos insistiam que o tempo iria ajudar a diminuir o sofrimento, mas eu não me reconhecia, não reconhecia minha vida. Nessa época a mensagem "TUDO PASSA"  de Chico Xavier / Emmanuel  era  a minha fonte de esperança nos momentos  mais difíceis.(http://www.youtube.com/watch?v=WNUsqeWjZSw). Passados alguns dias, iniciou-se um período de tentativa de retomarmos nosso relacionamento aos poucos.

6 DE JULHO = dia da constatação de que o encanto já havia sido definitivamente desfeito e qualquer tentativa seria infrutífera. Ainda passaram-se longos dias de Luto até que um anjo veio anunciar a chegada de um Novo Tempo. No dia mais improvável encontrei uma pessoa mágica que falou as palavras certas que me resgataram da escuridão e me trouxeram de novo à Luz! A cada frase dita, eu reconhecia uma verdade que ecoava na minha alma e lembrei a mim mesma tudo aquilo que sempre me guiou: meus valores!


6 DE AGOSTO =  Ritual de Renovação! Fiz uma reciclagem em várias áreas em que haviam referências ao casamento. Com uma felicidade inimaginável, me desfiz de objetos que não me pertenciam e reuni amigos para, como uma FÊNIX, celebrar a Nova Vida renascendo de minhas próprias cinzas!

6 DE SETEMBRO =  O Chamado! Esse foi o dia em que tomei uma atitude e resolvi iniciar a criação deste blog sem me dar conta de que estava fechando um ciclo e iniciando outro. Sincronicidade!!!! 

Esse foi o contexto em que eu estava quando iniciei a minha Jornada Heróica, o "MUNDO COMUM".